Ao mesmo tempo que olhava pela janela e tentava esconder-me do sol, decidi que tinha que sair de casa e fazer alguma coisa. Estava a morrer aqui em casa. Cheguei ao carro e olhei-me ao espelho. Fiquei ali a olhar para mim e a pensar nem eu sei bem em quê. Não tenho noção do tempo que ali estive, sei que estive parado a olhar para mim durante algum tempo.
Volto a mim. Não sabia ainda para onde ia, mas tinha que ir... Depois de algum tempo a circular no vazio, decido meter-me na Ponte 25 de Abril. Já em cima do tabuleiro, abrando a marcha do carro. Abrando um pouco mais. Olho para o Rio Tejo e penso: "e se eu acabasse com isto tudo da forma mais digna, em vez de me andar aqui a arrastar e a ser um tropeço para quem se cruza comigo?". Só me interroguei. Mais à frente, já fora da Ponte, acabaria por parar o carro e pensar... continuar a pensar... Parar na Ponte para pensar é que não, não fosse não fazer nada e depois além de continuar mergulhado neste imenso vazio ainda iria apanhar uma valente multa por estar parado em cima da Ponte.
Pensei. Sempre que estou no meio da multidão, sinto-me só, muito só. Simultaneamente, sempre que estou só, sinto-me com más companhias, daquelas que me vão levar para maus caminhos. Essas companhias sou eu. Afinal, o que ando eu aqui a fazer? Algumas pessoas simpatizam comigo, outras até gostam de mim, mas por mais que eu faça ou dê o meu melhor, existe sempre um clima de desconfiança inerente a tudo o que eu faço. Dou o exemplo da D.. Por mais que fizesse e desse o meu melhor, tudo aquilo era visto como engodo, como se estivesse a querer dar-lhe a volta para a ter caída por mim. Por mais que mostrasse quem eu era, no mau era "muito estranho", no bom era porque havia "qualquer coisa que não bate certo". Isto fazia-me confusão. Por exemplo, no tocante aos homossexuais. Sempre lhe disse que não era homofóbico, mas era contra o casamento entre homossexuais. Ela rebatia sempre a dizer que eu era homofóbico e não poderia conhecer os/as amigos/as dela (pelo meio chamava-me "quadrado" e "estúpido"). O mesmo sucedia com outros temas. Isto é muito injusto e desgastante... Por mais que estejamos a mostrar quem somos, a outra pessoa insiste em desconfiar do que estamos a mostrar. Como o exemplo da D. tenho outros com pessoas próximas a mim.
Afinal, se sou uma fraude aos olhos das pessoas e das que me vêem como deve ser não suscito interesse, que ando eu aqui a fazer? Um mero acessório para aquelas que simpatizam/gostam de mim e um "exemplo a não seguir" para quem não nutre um sentimento positivo por mim? Que função é esta que alguém pode ter? Que atentado à dignidade da pessoa humana é este que faz alguém com quase 30 anos, com muito para dar, com vontade de dar e de receber, com trabalho, com vida semi-orientada, honesto e sincero, se sinta assim?! Isto não é vida para ninguém...
Voltei para casa, fechei-me no quarto, fechei o estore e escrevi estes dois textos (posts 361 e 362). Agora vou para a cama. Vou ver se adormeço. Com sorte, vou acordar numa outra vida completamente diferente, onde existe pelo menos uma pessoa que me compreende e que consegue corresponder ao que sinto. Claro que isto é tudo um sonho... um mau/bom sonho. Como tudo nesta vida acaba, garanto que este meu tormento um dia acaba, a bem ou a... menos bem.