Como já tive oportunidade de referir aqui, em tempos cometi alguns actos dos quais actualmente não me orgulho. De início eram um desafio, mas com o tempo foram pesando na consciência, até que, quando consegui encontrar um mínimo de estabilidade financeira, tive o prazer de os deixar definitivamente de lado. Sempre tive habilidade para conseguir praticá-los deixando um traço de legalidade que me permitisse escapar a uma (merecida) sanção. Hoje orgulho-me de investir toda essa habilidade para os fins correctos e posso dizer que com relativo sucesso.
Porém, apesar de ter escapado às sanções em tempos, acabei por ser condenado a pena de prisão posteriormente sem que soubesse disso. Encontro-me a cumprir uma pena não inferior a 5 anos, com a atenuante de ser retribuído por isso. Não gozo de liberdade. Rodeiam-me algumas pessoas com experiência disto, algumas com experiência de outros estabelecimentos prisionais e que confessam que se perderem os vícios que têm no presente momento farão de tudo para regressar ao anterior pouso.
Os meus colegas de cela não gostam de mim e eu não percebo porquê. Se cometi nova série de crimes, desta vez contra eles, posso garantir que desconhecia que os estava a praticar! Mas não me quero ver envolvido em nenhum processo kafkiano, sendo condenado a cumprir uma pena além da que cumpro sem saber em que consiste, a sua duração ou sequer os factos de que sou acusado e que me levaram à condenação! Por uma questão de justiça, não me parece justo. Exijo ter conhecimento dos factos, quiçá defender-me das acusações e, se não for suficiente, pelo menos saber durante quanto tempo terei que cumprir a pena.
Como em qualquer prisão, nesta em que me encontro o boato e o rumor já circulou. Não sei qual, nem a quantas celas já chegou, mas sei que os meus colegas de cela são bons em difundir mensagens sobre terceiros e eu não sou excepção à regra. Quando aqui cheguei, a comissão de boas vindas, por entre sorrisos e palmadas nas costas, fez questão de me pôr a par do "joio". Hoje noto que em algumas celas, aqueles que outrora me receberam com simpatia, agora fingem que eu não estou presente, fingem que não me ouvem ou vêem e ignoram-me. É certo que se os confrontar com estes factos vão dizer que sou eu que tenho a mania da perseguição. Também é típico. Ainda assim, seria bom que olhassem bem para as suas costas, pois vivem num mundo de falsidade e ilusão, julgando que têm verdadeiros comparsas, quando na verdade têm amigos de conveniência.
Quando as coisas azedarem e pisarem os calos uns aos outros, aí terão oportunidade para verem quem são os verdadeiros amigos. Verdadeiros amigos esses que eu, durante algum tempo, julguei ter na prisão. Sinto-me traído. Tenho esse direito. Desconheço ter feito mal a quem quer que fosse (juro que desconheço) e tratam-me como se tivesse sido o autor de homicídios contra as suas famílias. Não fui. E sempre que me ofereci, fi-lo de coração!
Entretanto, eu aceito a pena principal que cumpro. É merecida. Já a outra deve ter vindo em bónus...