A defesa preemptiva está cada vez mais na moda, sobretudo após a Guerra do Iraque. O comportamento adoptado pela administração Bush foi veementemente condenado por muita gente um pouco por todo o planeta, mas o escopo daquela decisão teve apenas um fundamento: a antecipação a um potencial perigo. Mas, se pensarmos bem, não terá esta guerra ilustrado o comportamento do Ser Humano no seu dia-a-dia? Falo por mim, que tento, já quase que inconscientemente, antecipar-me aos perigos vindos do exterior e prefiro agredir a esperar poder ser agredido para reagir. Já fui assim e já tenho experiência suficiente para saber o que o mundo me reserva. Mas, qual paradoxo, não consigo deixar de acreditar que a boa fé pode andar por aí, embora cheio de reservas. E se calhar a boa fé já passou mesmo por aqui e tentou sentar-se à mesa comigo, mas eu recusei negociar com alegados terroristas e agora não só não consegui instaurar a paz no mundo como continuo obcecado com a minha segurança. Entretanto a vida passa ao lado, mas é mais confortável assim (apesar de ser mais paranóico) do que saber que poderei dar novamente o corpo às balas e ficar pelo caminho...
Nunca tive um verdadeiro modelo masculino para me inspirar, nem me lembro de em ocasião alguma ver os meus pais juntos a terem uma manifestação de carinho que fosse. Habituei-me a situações negativas e más experiências ao longo da vida nas relações interpessoais e hoje tenho sérias dificuldades em desligar-me e pensar e agir com isenção.
Hoje vi aquilo a que se chamava, quando eu era criança, de "bicho de contas e de histórias". O coitado estava virado ao contrário e fazia um esforço sobrenatural para se colocar como deve ser. Sem sucesso. Aproximei-me dele e tentei virá-lo. Imediatamente encolheu-se, fechando-se, como que reagindo por instinto a um possível predador. Fiquei a olhar para ele, esperei que voltasse ao normal e continuou a longa batalha de se tentar virar. Insisti mais uma vez, virei-o e o bicho abandonou a sua posse defensiva e seguiu o seu caminho. No outro dia vi uma joaninha, insecto que não via há muitos, muitos anos. Fiquei a olhar para ela como se fosse a primeira vez. Matei saudades das joaninhas e não consegui esconder a emoção que senti perante um acontecimento tão banal.
Raramente sei o que fazer nas relações com as pessoas e tendo a agir por sobrevivência e instinto a toda e qualquer potencial ameaça que atente contra mim. Não sou mau, não sou abominável, não tenho mau carácter. Apenas não sei o que fazer e o primeiro impulso leva-me a encolher-me e, se acreditar que corro o risco de me magoar, mostro os meus espigões, qual ouriço-caixeiro (sim, também vi um aqui há algumas semanas e logo tentei travar amizade com ele).
Toda esta experiência de vida faz com que hoje viva em constante dualismo comigo mesmo. Qualquer aproximação ou qualquer acto ao qual não tenha frieza de ânimo para processar e encontrar a reacção adequada e entro em curto-circuito. Seguidamente, a minha consciência e a minha racionalidade dividem-se em duas, transitando para o "estado filme policial americano": primeiro, surge o bad cop (ou "mau Rodrigo") que me diz constantemente ao ouvido "vê o que a pessoa te fez", "já te fizeram isto antes e sabes como acabou", "achas que o que esta pessoa te fez é inocente?", "achas mesmo que estão aqui boas intenções?", etc. Depois sobe a parada "devias cortar imediatamente com isto", "devias reagir à altura e acabar com o mal pela raiz", "desaparece daqui", "desaparece de vez", "só te sabem fazer disto", "morre, que não serves para nada e não fazes cá falta nenhuma"! Não é fácil lidar com estas situações quando não as esperamos e não sabemos lidar com elas! Porém, ficamos sem reacção e deixamo-nos levar. Pelo menos falo por mim.
Posteriormente, sem que nada o faça prever, nem aconteça nada nesse sentido, e por vezes apenas algum tempo depois de tomar uma atitude precipitada, entra em cena o good cop (ou "bom Rodrigo") para me chamar à razão e dizer "o que é que foste fazer?", "já pensaste que as coisas podem não ser como viste inicialmente?", "tem calma", "esta pessoa tem muitas virtudes", "conversa com a pessoa e tenta entendê-la".
Por norma, acalmo-me nesta situação.
Depois fico furioso comigo mesmo, pelos erros cometidos e volto a entrar em paranóia. Às vezes estou bem e, sem que eu o controle, faço uma introspecção à minha vida, fico em branco e desespero. Regresso ao dualismo. Não sei como agir. Não sei em que me inspirar. Não sei em que me basear. Como aprender a viver? É tão fácil dizer "descontrai e deixa-te levar", mas isto são palavras de pessoas com um crescimento completamente diferente do meu. Sinto-me como o Mogli, como se tivesse perdido grande parte da minha vida a ver agressões, mentiras, enganos e ausência de amor, mas tenho consciência que tenho um bom fundo e muito para dar, mas... não sei como projectar tudo isso cá para fora e ser uma aposta válida, em vez do "homem-lobo" que se protege e defende do saudável e abre o peito a tudo o que é negativo.
Não consigo praticar sexo ocasional. Claro que me sinto em condições para tal e a ideia do sexo em si, como alto portador de testosterona que sou, deixa-me agradado. Mas sinto-me muito desconfortável com a ideia do que acontece antes e depois do acto sexual. Incomodam-me os beijinhos, os abraços, os carinhos e tudo o que tenho que fazer para chegar ao que realmente interessa com alguém por quem não tenho qualquer sentimento ou ligação que não seja o de mero respeito. A vontade de partilhar algo tão íntimo como um beijo com alguém por quem não sinto rigorosamente nada, é algo que me aflige. Pós-acto sexual então ainda mais tormentoso é.
Só consigo transmitir amor e carinho (em quantidades industriais) por quem tenho, realmente, um sentimento tão forte e nobre como o amor. Sem isso, é para esquecer...
A desilusão. Como lidar com ela? Hoje tive outra. Daquelas grandes. Não, não envolveu pessoas, nem relações pessoais. É curioso que sempre que me acho preparado para todas e "calejado" pelos desgostos provocados pelas desilusões, rapidamente concluo que afinal não estava preparado. Nunca estamos. Não interessa o nosso grau de experiência em lidar com a adversidade, estamos sempre disponíveis para encaixar mais uma e para reagir mal. É como se julgássemos que já batemos no fundo e já atingimos o limite máximo de facadas nas costas. É sempre possível ir um pouco mais fundo e descobrir mais um espaço no nosso coração pronto a ser trespassado por uma faca que julgamos desta vez ser aquela que nos deixará imunes a tudo na vida. Não deixa. É possível afundar-nos ainda mais.
Contudo, vou notando algumas diferenças à medida que a experiência aumenta. Já não tenho como reacção zangar-me com o mundo, ter vontade de partir o que aparecer à frente (embora sem nunca o ter realmente feito), desistir de tudo, gritar de raiva, etc. Agora limito-me a embrulhá-las em slow motion e a sentir lentamente o vazio a tomar conta de mim. Não sei se sofro. Sei que fico sem reacção, coço a cabeça, olho para o vazio, penso no nada, suspiro profundamente e, finalmente, deixo o corpo desfalecer, ficando estático. São minutos perturbantes.
Volto a mim. Tento encontrar um nexo causal que justifique que o facto X, tenha acontecido no momento Y, comigo (Z). Forço várias soluções. Faço questão de encontrar o tal nexo causal e fico pior por não encontrar nenhum motivo. Penso porque raio certas coisas acontecem comigo. Penso na minha reacção à desilusão. Penso nos que me rodeiam e pelo menos aparentam serem felizes. Penso nos que têm tudo para serem felizes. Julgo que as minhas concluões são influenciadas pela dita desilusão.
Faço uma introspecção rápida por toda a minha vida. A minha Páscoa e o meu Natal são celebrados neste tipo de situações, acontecimentos que me forçam a dedicar-me à meditação sobre tudo o que tenho feito. Penso como seria se tudo fosse diferente. Penso como seria se muita coisa fosse diferente. Penso como seria se algumas coisas fossem diferentes. Penso como seria se apenas uma coisa fosse diferente. Deve haver um motivo para serem como são. Se calhar não há motivo nenhum e isto sou eu a complicar aquilo que é simples.
Penso se vale a pena continuar a lutar. Penso porque devo lutar se não sei bem pelo quê. Penso sobre o que faço aqui. Penso como seria a vida dos que me rodeiam se eu não estivesse presente. Penso como seria a vida dos que me rodeiam se eu nunca tivesse existido. Penso como será a vida deles se eu continuar. Tento vislumbrar os meus limites para suportar desgostos e desilusões.
Acabo no meu blogue, com os dedos deitados sobre o teclado, a olhar para o vazio, a suspirar profundamente, a pensar no nada e a preparar-me para clicar em "publicar" antes de me deitar e deixar que o meu corpo desfaleça entre pensamentos vazios e inércias em resultado da desilusão de hoje. O sono tem isto de bom, ajuda a enterrar um dia passado bem como todos os seus dissabores. Não quero saber como será amanhã, mas sentirei que vou estar mais que preparado para enfrentar qualquer desilusão que possa ter até descobrir que afinal... não estava.
Falava ontem com uma amiga minha que se queixava do facto do marido ser extremamente influenciado pela mãe e desabafava que sempre que se juntava no meio familiar dele era simplesmente impossível levar o companheiro a fazer o que quer que fosse se a mãe já se tivesse pronunciado sobre isso naquele momento ou noutra altura. Pessoalmente, eu compreendo-o e desculpo-o. Perguntei-lhe como é que a mãe dele o criou, se através de um regime presencial ou de concertação com o marido na possibilidade dos dois trabalharem. Respondeu-me aquilo que eu já esperava: a senhora sempre foi doméstica.
As mulheres domésticas que assumem a função de "gerir a casa" têm uma posição privilegiada na família e na sociedade, que outras inseridas noutras funções, até mesmo de topo, não têm: elas têm o poder de educar os filhos de acordo com os seus padrões. Imaginem que são programadores informáticos (mãe) e têm a possibilidade de configurar um sistema operativo (filho) de acordo com a vossa preferência. É isto que muitas mães fazem com os filhos, seja consciente, seja inconsciente. É por isto que muitas mulheres se queixam das sogras que têm: não têm a mínima hipótese de combater em igualdade de circunstâncias pelo monopólio do homem em causa. Não digo que devam relevar esta realidade e ignorá-la, mas devem desculpar o vosso companheiro, pois ele não age de forma consciente: foi formatado neste sentido.
Eu hoje tenho consciência disto, o que me deixa ainda mais furioso. Não, não é confuso. Eu tenho a certeza absoluta que fui educado desta forma e vejo isso pela forma como as mulheres presentes na minha educação e crescimento me influenciam nas minhas barbas. Sempre que estou decidido a fazer qualquer coisa, se alguma delas diz uma palavra em sentido contrário, não me anulo, nem volto atrás (excepto em decisões que queira tomar e no fim conclua que, de facto, não iria agir com bom senso), mas não consigo deixar de sentir um peso na consciência por não lhes ter dado ouvidos e não descanso enquanto não provar a mim mesmo que afinal estava certo. Não basta ter a certeza que não estava errado. Há que me garantir que estava certo com um elevado nível de segurança.
Passo a dar um exemplo banal: vejo na internet que amanhã vai estar calor e sol. Se tiver o azar de ouvir a minha mãe dizer que o tempo está bom para levar um casaco porque está vento, eu até posso não o levar, mas à primeira brisa que sinta, ainda que não sinta frio, questiono-me porque não levei um casaco como a minha mãe tinha dito. A partir daí não descanso enquanto não assegurar que está, de facto, tempo para não levar casaco para sentir que tomei uma boa decisão. Aquela simples brisa passa a ter o mesmo efeito de uma ventania.
Esta situação deixa-me furioso porque sei que estou a ser inconscientemente manipulado, tenho consciência disso, recuso-me a cumprir o que é dito só por vir de quem vem, mas aquela treta não consegue deixar de me influenciar! Acreditem, é perturbador.
Poderia dar muitos outros exemplos meus e de outros homens que conheço. Não é uma questão de idades, não é uma questão de consideração ou respeito, não é uma questão de profissão ou perfil. É uma questão de educação e manipulação. É por isso que não vale a pena que mulheres com homens assim tentem competir com as mães. Uns resistem, mas enfrentam a paranóia de ter que garantir que afinal elas estavam erradas, vivendo numa luta interna de cada vez que é emitido um comando materno. Outros entram num estado de hipnose tal que nem questionam o que é dito e limitam-se a cumprir inconscientemente as ordens da figura feminina que os formatou. Não é por mal, nem é por amarem mais a mãe do que as companheiras. É que antes delas se conhecerem por pessoas, já a mãe deles fazia o "format c:" e instalava-lhes o sistema operativo materno correspondente, sem imperfeições. Hoje, enquanto a nora esperneia e faz de tudo para ganhar um jogo a feijões com a sogra, esta não precisa de mexer uma palha, bastando dizer uma palavra para que tudo se posicione a seu favor.
Há uns tempos visitei um país oriental. Já tinha curiosidade em "conhecê-lo", mas quando "o conheci", de facto, foi amor à primeira vista. Já aqui descrevi parte da minha experiência por lá, mas há algo que ainda não tinha referido e que me fez identificar com as pessoas deste "planeta": enquanto gaijin (palavra dada pelos nativos deste lugar aos que vêm de fora) e observador (sim, observo e registo literalmente TUDO o que se cruza no meu campo de visão periférica), pude olhar para os "seres" que se cruzavam comigo e tentar perceber como são e o que sentem.
Não se vêem assim tantos gaijin e nem dos que se vêem nem todos captam os olhares dos nativos, sobretudo se forem o tipo de gaijin que anda de calções, meias e sandálias. Isso não é "ocidental", é apenas desinteressante. Eles não olham para esses, que eu sei! Contudo não pensem que tudo são rosas: o pior que um gaijin pode enfrentar neste local é perder a imagem de "novidade". Se se transforma em "mais um que veio cá" sem nada de diferente para oferecer, acaba pior que os outros de calções, meias e sandálias.
Este povo olha e tira as medidas a todos os que tenham características físicas diferentes das deles e se vista de forma diferente. Gaijin de jeans, ténis de marca, blazer, estilo grunge ou desportivo (na onda dos surfistas e skateboarders), com outros adereços que digam "eu encarno o Ocidente e apresento-me de uma forma diferente da vossa". É para estes gaijin que eles olham! Olharam para mim, porque não uso calções, meias e sandálias. Senti que tentavam identificar os traços que eu tinha do outro lado do mundo. Olharam vezes sem conta, mas sempre que os confrontei com o meu, desviavam timidamente o olhar.
É uma sensação estranha, esta. Sobretudo num "planeta" em que as pessoas saem de todas as formas e feitios à rua (literalmente de todas as formas e feitios) sem que sejam acusadas de atentado ao pudor e sem que os equivalentes ao nosso género masculino torçam os pescoços para ver melhor as equivalentes femininas, ou sequer olhem de soslaio. Ninguém quer saber de ninguém. Só dos gaijin.
Andar nos transportes públicos deste local é uma experiência tão estranha e tão banal, quanto saborosa, sobretudo para pessoas como eu, que sou gaijin em mim próprio - embora por vezes seja daqueles gaijin de calções, meias e sandálias. É simplesmente indescritível a sensação de circular em transportes cheios de gente (sem ser obrigatoriamente à pinha) e observar que cada um está por si como se circulasse sozinho em cada carruagem. É uma estranha sensação de sermos únicos no mundo com uma impressionante solidão. É o estarmos literalmente rodeados de gente e sós, abandonados, sem ninguém querer saber de nós. É o incómodo provocado pelo desprezo que se associa ao alívio por não dar nas vistas. É olhar em volta e ver gente tão diferente que por vezes parecem todos iguais e é como se olhássemos em direcção ao vazio e pensar no ontem, ou até no amanhã (os pensamentos de que não nos lembramos do que estamos a pensar são os "pensamentos no amanhã", que, por ainda não terem acontecido, não nos lembramos deles).
Em suma, é uma sensação ímpar, que mexeu comigo, e me fez ver, para meu alívio, que afinal não só existe Marte, como lá ainda existem formas de vida que se assemelham a mim! Voltarei lá, definitivamente, nem que seja para ter a mesma sensação conjunta de unicidade e solidão. Sim, senti-a em quem me rodeava e sempre que me banalizava e perdia a imagem de "novidade". Impagável!
Há cerca de dois meses li sobre um novo fenómeno da internet: Chat Roulette, um sítio de conversação onde se tem acesso a milhares (há quem refira que são várias dezenas de milhar) de pessoas de todo o mundo que, simultaneamente, se mostram através da câmara. Sempre que o utilizador estiver insatisfeito com a pessoa que lhe foi destinada pela "sorte" da "roleta", pode imediatamente cancelar a ligação e pedir que a fortuna lhe apresente outra pessoa e assim sucessivamente. Uma espécie de Netmeeting dos tempos modernos.
Logo no meu primeiro dia de visita tive uma experiência muito "rica" (puro eufemismo): desde vários rapazes e homens que exibiam os seus órgãos genitais e/ou se masturbavam para a câmara, a pessoas que se limitavam simplesmente a olhar para quem estava do outro lado, uma jovem oriental que exibiu o seu corpo e se masturbou em directo, rapazes que exibiam cartazes personalizados para o espaço e onde pediam que as moças/mulheres lhes exibissem os seios, pessoas que faziam caretas, gente que injuriava e fazia gestos obscenos, gente que escondia a sua própria imagem e apenas apreciava (ou não) o destinatário, jovens e mulheres maduras em lingerie e/ou a exibir o corpo, gente que colocava a câmara em locais estratégicos e fazia de uma determinada divisão da casa uma espécie de Big Brother onde qualquer um podia seguir a sua vida naquele compartimento, e gente que simplesmente queria conversar. Sim, tive isto tudo no primeiro dia.
No segundo dia a experiência já não foi tão vasta, mas começaram a sobressair alguns comportamentos sobretudo o de homens a exibir os seus genitais e a masturbarem-se. O espaço perdeu o interesse, embora tivesse insistido várias semanas nele para poder acompanhar os comportamentos que se verificam num site onde cada um pode ser quem quiser e fazer o que quiser. Sempre que estiver insatisfeito com o que vê, despacha e passa à experiência seguinte. É incrível o que as pessoas são capazes de fazer quando julgam ser impossível a sua identificação e eventual denúncia. O Ser Humano é capaz de se vulgarizar e exibir a sua psique (sim, a verdadeira!) através da internet com uma facilidade assustadora.
Contudo, o que mais gostaria de salientar diz respeito à banalização das relações e à deflação que o Ser Humano tem em pleno século XXI. No fundo, este site revela como é possível descartar pessoas com a mesma facilidade com que se respira. Ninguém se preocupa em saber se do outro lado está alguém a precisar de conversar com outra pessoa ou com feridas na alma. Importa o nível de satisfação pessoal de cada um, e que é cada vez mais exigente! Basta um clique e já vem aí a próxima pessoa. É o conceito do zapping televisivo adaptado às pessoas. Atenção, eu disse PESSOAS, ou seja, seres com a capacidade de pensar, sentir e agir. Não me refiro a maquinetas pelas quais as pessoas parecem demonstrar mais afecto do que por qualquer outro Ser da sua espécie.
Paralelamente a este site, assinalo os canais seguidos pelas novas gerações como a MTV, com programas semelhantes ao "Chat Roulette!": Next, Room Raiders, I Want to Date Your Mom, Parental Control, entre outros. Todos eles primam pelo mesmo conceito: o programa centra-se num jovem do sexo masculino ou feminino, colocam à sua escolha vários jovens possíveis de sair ou ter um relacionamento e cabe à "estrela" de cada programa escolher aquele que melhor lhe aprouver. Os critérios de escolha são quase sempre duvidosos e dependem, essencialmente, do capricho de cada um. O que é certo é que basta um "não", "próximo", "adeus" e está feita a exclusão em detrimento de um outro que se habilita à mesma sorte.
É preocupante saber que este conceito televisivo e internáutico é cada vez mais seguido por jovens e adultos no dia-a-dia. As pessoas são, de facto, descartáveis. Para quê haver o esforço de investir em alguém, dar uma segunda oportunidade, compreender as diferenças e aceitar os defeitos, ou conhecê-la um pouco melhor quando tem ao seu alcance um mundo recheado de novas hipóteses de encontrar alguém que não cometa erros e que aceite adaptar-se à sua forma de ser? Vivemos num mundo cada vez mais egoísta, onde tudo tem que girar à volta do "eu", caso contrário faz-se um clique e tudo volta ao normal. Não há o mínimo interesse em esforçar-se ou em considerar que do outro lado está alguém com sentimentos, com uma história de vida, com um perfil condicionado pela sua experiência de vida. Clique... next.
É ainda curioso saber que as pessoas recorrem aos clichés e apregoam que não são assim, que se esforçam mas a situação é que não era sustentável. São assim, não se esforçam o suficiente e por vezes é sustentável com um pouco de paciência. As relações humanas são cada vez mais banalizadas, as pessoas perdem o seu valor enquanto pessoa e são tratadas como máquinas, com prazos de garantia e tempo de vida reduzidos, tornando-se obsoletas em escassos dias.
As pessoas têm as suas prioridades trocadas e iludem-se com a virtualidade que a vida lhes oferece. Virtualidade essa que não devia passar de um ecrã de computador, durante as navegações em sítios da rede, mas que consome os sentimentos e emoções de Seres Humanos cada vez mais indisponíveis para sofrer, amar, odiar e perder tempo. Vivemos a um ritmo alucinante, temos pressa para tudo e queremos ser práticos e eficientes nas nossas escolhas, procurando variá-las o mais possível. Contudo, no meio de tudo isto, esquecemo-nos daquilo que é mais importante e dá razão à vida: o verdadeiro amor!