Detesto estas coisas de recordar tudo o que passou ao longo do ano. Este é o exercício mais triste que podemos fazer: recordar o passado, a maior parte do qual, triste! Existe maior masoquismo do que fazermos um cocktail de dramas, emoções e sentimentos negativos? E, pior, fazê-lo repetidamente e acreditar que quando o calendário marcar a meia-noite de um novo ano do calendário gregoriano, tudo vai mudar? Acreditam mesmo que tudo depende de um calendário criado à imagem de imperadores romanos?
Não sei quanto a vocês, mas para mim, recordar é viver e se insistimos em recordar um passado todo ele triste, então estamos a viver tristeza! Prefiro recordar o futuro - já que o presente também é dramático - e concentrar-me na ilusão de que um dia tudo vai ser diferente. Sempre oferece maiores possibilidades de felicidade do que recordar o que já está morto, mas ainda não está enterrado porque nós, portugueses, fazemos questão de idolatrar os defuntos e pensar "tudo podia ser diferente", quando, realmente, pode... mas basta acreditar no amanhã - que não é propriamente o dia 1 de Janeiro do calendário, mas pode ser o dia 1 de Janeiro da nossa vida!
Não sei se se trata de uma malapata, se de uma virtude. Gosto de mulheres emancipadas, que não precisem que o homem lhes abra a porta, pague contas, circule à sua volta ou rasteje para que se sintam vivas. Tenho a sorte de ter conhecido algumas assim, apesar de conhecer imensas como as que aqui critico.
No entanto, intriga-me o facto de todas as mulheres que conheci nestas condições e com as quais não houve um contacto íntimo, sempre que me pagaram uma refeição, escassas semanas depois conhecem um tipo e prestam-se imediatamente para casar com o respectivo. É estranho mas as visadas podem estar meses sem ninguém que, se me pagarem um jantar sem que a refeição seja sucedida por relações sexuais, as senhoras encontram alguém, mas não é apenas alguém com quem iniciam uma relação. Não, é alguém de quem ficam quase imediatamente noivas! Será que as ajudo a abrir os olhos? Será que vêem a luz reflectida em mim e, numa epifania por entre uma garfada de risotto, vislumbram que não podem continuar nesta coisa de refeições com indivíduos que representam uma situação sem garantia de futuro no longo prazo?
Ao buda esfregam a barriga para dar sorte. A esta espécie de Santo António dos nossos tempos pagam refeições. Numa versão descartiana daria qualquer coisa como "pago, logo caso". Será que se sucede um "caso, logo sou feliz", ou este exercício de lógica do discurso resulta numa conclusão falaciosa?