Caminhei durante largos dias rumo ao precipício. Hoje estive à beira dele. Como suicida que sou, dei o passo em frente. Vale tudo pela liberdade que tanto me custou a conquistar. Aliás, acho que nunca soube, verdadeiramente, o que é ser livre. Apenas sei o que é estar preso e não querer estar nesta situação.
A minha vida tem sido um pouco assim: nunca soube o que queria, apenas sabia o que não queria. Aprendi a tomar opções com base na exclusão de hipóteses e, uma vez chegado a um ponto em que não sabia o que mais excluir, acabava por fazer uma selecção com base na pura sorte. Talvez por isso me tenha dado mal bastantes vezes: faltou excluir mais umas quantas "más opções".
A verdade é esta: não sei o que quero e a vida continua a passar, sem me dar a possibilidade de voltar atrás e remediar as más escolhas. E o mais irónico é que ao longo de todos estes anos ainda não consegui aprender a fazer escolhas, apenas algumas exclusões.
Seleccionar com base na exclusão e não na consciência do que se quer é extremamente frustrante, mas, quiçá, ousado: a via mais turtuosa e, talvez, a mais dolorsa, é enfrentar cada coisa que não se quer e dizer-lhe "não", nem que este seja feito com base na fuga. Este traço é característico em pessoas orgulhosas, como eu, que podem não ter nada, mas fazem tudo para preservar a sua dignidade, ainda que por vezes se arrastem à procura de uma saída.
Pessoas orgulhosas, como eu, não conseguem conceber uma vida sem liberdade, aliás, uma vida de prisão. Assinei a minha sentença, mas sinto a consciência tranquila. Não estou em paz, porque temo as consequências que possam resultar desta minha decisão, mas, por qualquer motivo que seja, sinto-me como se tivesse vencido um campeonato. Um campeonato interno, que ninguém quer saber se eu ganho ou perco, mas, naquela dúzia de minutos, aquele campeonato é tudo para mim, e eu nunca consegui jogar a feijões.